Gastronomia

Semana pra Dança é encerrada com espetáculo premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte

A Semana pra Dança foi encerrada na noite de domingo (6) no Armazém Cultural, em Campo Grande, com o espetáculo “Ou 9 ou 80”, da Clarin Cia de Dança, formada por bailarinos do Rio de Janeiro e de São Paulo. Eleito melhor espetáculo de dança presencial de 2021 pelo Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), a apresentação traça um paralelo entre as duas cidades ao abordar as nove mortes em um baile funk em Paraisópolis (SP), e os 80 tiros disparados no carro de uma família em Guadalupe (RJ), que resultaram na morte de um homem.

Kelson Barros, diretor da Clarin Cia de Dança, explicou o que o espetáculo retrata. “O espetáculo aborda dois trágicos episódios, que conectam o Rio e São Paulo. O ‘9’ refere-se às mortes ocorridas na dispersão do baile em Paraisópolis, e ’80’ aos tiros disparados pelo exército contra a família de um músico em Guadalupe. Usamos isso como ponto de partida; é um trabalho de denúncia que, ao mesmo tempo, é de alegria. A gente volta para a tristeza, mas já está alegre novamente, seguindo como é a vida periférica”.

Para a Companhia, ser convidada para a Semana pra Dança foi uma enorme alegria. “É mais um Estado que visitamos. Este espetáculo é aceito em outros festivais. Quando falamos que é um espetáculo de passinho e funk, enfrentamos muito preconceito, mesmo sem que as pessoas saibam. Ao ouvir a palavra ‘funk’, já pensam que haverá mulheres peladas ou drogas, mas, ao assistirem, percebem que não é nada disso. Fico muito feliz em participar de festivais”, detalha Kelson.

O bailarino Felipe Silva, conhecido como Pablinho MJ, contou que a dança o salvou de destinos piores, que levaram seus amigos a caminhos complicados na periferia. “Eu evoluí muito rápido no passinho, comecei em 2013 e fui me destacando, até participar de uma companhia de dança. Me sinto realizado na Clarin. A dança é tudo para mim; é cura, paz, é quando esqueço meus problemas. Ela me salvou, porque onde eu venho há muita coisa que pode infectar a mente. Já perdi muitos amigos para o crime, e dançar hoje me resgatou. Sou de Manguinhos, favela da zona norte do Rio de Janeiro. Nunca tinha vindo a Campo Grande, gostei muito, é um lugar quente. O carioca adora calor; é um prazer apresentar o passinho aqui”.

A bailarina Juju ZL, do extremo leste da capital paulista, compartilhou sua experiência com o preconceito que o estilo de dança funk ainda sofre. “Sempre dancei, desde a infância, mas, na dança profissional, foi em festas LGBTQIAPN+ pretas, onde comecei a competir, ganhar e participar de alguns trabalhos. Participar da Clarin é fantástico; poucas vezes temos a chance de mostrar a seriedade de ser dançarina do funk, um movimento musical marginalizado, e da dança, especialmente a jogação, que sofre muito preconceito e é vista como não profissionalizada. A Clarin respeita nossa vivência, e isso é muito importante para mim”.

Juju ZL também falou sobre o preconceito que enfrenta por ser uma bailarina gorda, negra e da periferia. “Enfrento diversos preconceitos. Para mim, esses preconceitos atravessam nossos corpos. Encontrar um lugar de trabalho que não me discrimine é libertador. Onde venho, as pessoas têm preconceito em nos contratar, acham que vamos demorar ou que ficaremos cansados. O sistema nos marginaliza ainda mais. Ser um corpo gordo e preto na dança é libertador. Há companhias que não têm o acolhimento que a Clarin oferece. É absurdo poder trabalhar com o que amo, sabendo que esses recortes podem excluir algumas pessoas. É incrível como a dança nos leva a lugares que nunca imaginamos; conhecer festivais e cidades é fantástico. Se não fosse pela dança, nunca estaria aqui”.

Na plateia, Iara Caroline, acadêmica de teatro na UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), disse que o espetáculo trouxe uma série de emoções. “Eu ri, chorei, me emocionei, me diverti, pensei, fiquei aflita e ofegante. É incrível a capacidade deles de colocar tantas coisas em tão pouco tempo. Estou muito grata, foi um presente, melhorou meu dia e minha semana. Precisamos de mais iniciativas como essa. Participei de algumas oficinas da Semana pra Dança e fui a alguns espetáculos. A iniciativa foi esplêndida, necessária. Precisamos de mais investimentos, porque a arte é fundamental para viver”.

Ianara Ribeiro, estudante de contabilidade, também prestigiou o espetáculo e participou da Mostra de Coreografias com o Conexão Urbana. “Achei o espetáculo maravilhoso, incrível, tocante e emocionante. Me representou muito e trouxe muitas referências. Adorei, foi perfeito. A Semana pra Dança foi incrível; quero parabenizar a organização. A proposta do evento é maravilhosa, incentivar a cultura de todas as formas, e entregou muito mais do que eu esperava, e eu esperava bastante!”

Os artistas da dança e acadêmicos do curso de dança da UEMS, Karen Escobar, Alisson Muniz e Laura Gabriela, prestigiaram o espetáculo de encerramento da Semana pra Dança. “Estou extremamente feliz por ter presenciado a arte na sua forma mais pura. Adorei o espetáculo; foi tão tocante, profundo, e ver a cultura do funk aqui presente, ainda mais uma cultura que tende a ser apagada, é muito bom. É muito forte e importante; estou muito feliz”, disse Karen.

Alisson comentou sobre a experiência. “Fico feliz por ter recebido a companhia e por ter vivenciado um pouco da cultura do Rio de Janeiro e São Paulo no que diz respeito ao passinho. É ótimo ver esse contexto cultural sendo apresentado nacionalmente e ganhando espaços, além de valorizar a cultura periférica”. Laura achou a Companhia Clarin muito potente: “Trataram de assuntos sérios, tragédias, de uma forma muito respeitosa, sem perder a potência e a energia da favela. Estou encantada com o trabalho deles”.

A Semana pra Dança foi realizada pelo Colegiado Estadual de Dança de MS e Associação Arado Cultural, com investimento da FCMS (Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul), Setesc (Secretaria de Estado de Turismo, Esporte e Cultura) e Governo do Estado de Mato Grosso do Sul.

Karina Lima, Comunicação Setesc
Fotos: Lucas Castro/Setesc